Yatai, A Barraca do Aconchego
Noites frias ou quentes depois do expediente, seu corpo pesa. Não quer ver gente. Está de saco cheio do mundo. O concreto da cidade não ajuda. Voltar logo para casa no escuro, sem ninguém para te receber e ainda ter de cozinhar algo? Nem ferrando!
O cotidiano do japonês na maior parte do ano é assim. Dias estressantes, protocolos e rituais que esmagam o trabalhador japonês, normalmente os izakayas são os únicos refúgios. Mas tem noites, que nem aquela bagunça gostosa é suficiente para levantar a sua moral – ou você quer sossego mesmo.
Para esses dias coitados, existem os Yatais, as tradicionais barracas ou carroças de comidas que se espalham por todas as metrópoles japonesas. Não é só em Tóquio. Qualquer grande centro, tem os Yatais. Uma vez já parei na beira de estrada. Eu, o Yatai de Oden rodeado de arrozais.
Em contato com o Daniel Parolin Hirata, do Hira Ramen Izakaya, que está bem longe, no caos natural, quase pegando o Tufão 21 que devastou as províncias de Osaka, Hyogo e Kyoto, o terremoto de Hokkaido. Digamos que Daniel foi causar no Japão. Tudo isso graças à sua esposa, a Valéria Cedano Hirata que segura o Hira, a brigada inteira, a casa e os filhos. Ele deveria ser santificada.
Ele está nesta viagem com foco em Hakata, na cidade de Fukuoka, bairro boêmio onde se produz um dos três melhores rámens do Japão. o Hakata Tonkotsu Ramen. Além de Fukuoka ser berço maternal do Adegão, o ser que vos escreve, que muito antes de conhecer Tóquio ou Kyoto, dominava todas as ruas de Fukuoka. Daniel está acompanhado de seu cozinheiro, o Felipe Nunes (Tucupi), e estão comendo de tudo a ponto de estarem prontos para ser abatidos por Jefferson Rueda.
O Yatai 屋台, lógico que não é uma exclusividade nipônica. No Brasil temos os carrinhos de cachorro quente e pipoca (quando a prefeitura deixa). Nos Estados Unidos, os trailers de lanches e sorvetes. Na Ásia toda há mais barracas do que restaurantes. No Japão não poderia ser diferente. A bordo de carroças, bikes, motos ou caminhões. Os Yatais são como os food trucks. Se mantêm em lugares fixos ou móveis para eventos.
Agora, um lugar especial é o bairro de Nakassu, ou chamado de Ilha dos Yatais. Em cada rua tem um diferente servindo alguma comida. À beira do rio, então, são tantas opções que vão desde os clássicos odens, rámens, yakitoris, udons, takoyakis, tempuras, yakissoba, até doces como imagawa manju, bolo castela, castanhas doces, dorayakis, raspadinha de gelo etc. Precisaria ficar um mês no mínimo para conhecer todas as barracas.
O Daniel fez uma peregrinação em Nakassu e em Tenjin, que é um bairro mais bonito, pois está em busca de inspiração para o seu novo cardápio no Hira. Claro, irá aprimorar os seus rámens e aumentar o repertório de estilos. Dominar o caldo de porco, é quase que obrigatório ir para Hakata.
Muitos não sabem que os primeiros Yatais ficavam perto dos portos e vendiam: sushis. Isso mesmo. Sushi era fast food e os cozinheiros precisavam vender o quanto antes os peixes, pois eram tempos sem eletricidade. Não tinha como armazenar os peixes crus.
Perguntei a ele porque escolheu Fukuoka, a cidade do Adegão? Ele respondeu: “Adegão, eu sabia que os mais antigos Yatais ficam aqui. E barracas que estão há anos ou até décadas, eu precisava estar em contato com eles. Conversar com eles, sentir e respirar o mesmo ar. Só assim, eu poderia absorver algo. E a culpa é sua, quando fica postando as fotos de comidas no Circuito do Sake.”
Me desculpe Valéria.
Fotos: Daniel Parolin Hirata