A vez do verde
Verdadeiras aliadas da saúde, as ervas também são bastante versáteis à mesa, atribuindo variedade de sabor, aroma e textura às receitas
Incluir o louro no cozimento do feijão é etapa essencial de uma receita verdadeiramente brasileira. Ou finalizar a moqueca com um punhado de coentro – que, apesar dos protestos contra seu uso, é um dos sabores indispensáveis que caracterizam esse preparo tão querido.
As ervas aromáticas estão sempre presentes na lista de ingredientes das mais variadas receitas. Algumas resultam em bons chás, outras atribuem novos sabores aos preparos. Todas elas, no entanto, são altamente benéficas à saúde.
Do bem
Gabi Pastro, bióloga e especialista em ervas e especiarias, afirma que, além de oferecer sabor e aroma aos pratos, as ervas são ótimas para limpar o organismo. “Elas são extremamente antioxidantes. Muitas ainda são anti-inflamatórias, como o alecrim e a melissa. Elas previnem o envelhecimento precoce e ajudam a evitar a formação de radicais livres em nosso corpo. Também nos protegem de eventuais mutações, até em casos mais graves, como o câncer.”
Cada tipo de erva carrega nutrientes específicos, caso do louro, que, além de incrementar o feijão do brasileiro, é carminativo, ou seja, evita a formação de gases tão comum às leguminosas. “A cebolinha é rica em vitamina C e a salsinha é ótima para repor ferro e minerais”, afirma Gabi, que também ministra cursos e oferece consultoria com sua marca Horta e Saberes.
Contudo, para garantir todos esses benefícios, é preciso utilizá-las da maneira mais fresca possível. Isso porque as propriedades se perdem quando já estão secas ou são submetidas a altas temperaturas. Para isso, o ideal é ter vasinhos em casa e retirá-las das plantas somente na hora de incluí-las nas receitas.
“Qualquer erva pode ser plantada, mas é indispensável que tenham no mínimo 4 horas de sol por dia”, diz a especialista. “Elas precisam de contato direto com o sol sem interferência de vidro, mesmo que transparente. Caso contrário, a erva pode até viver, mas não terá sabor nem aroma.”
Para aqueles que não têm tempo de se dedicar às plantinhas, que demandam constante atenção, Gabi diz que ter contato com produtores é boa solução. O que, de quebra, ainda dá a garantia de estar consumindo produtos orgânicos, livres de substâncias químicas.

Do nosso quintal

Cebolinha, salsinha e alecrim são algumas das ervas mais utilizadas e consumidas no Brasil. Entretanto, a maioria deve sua origem ao Mediterrâneo. “Elas pouco têm a ver com nosso clima. As que são propícias a nossa região são muito mais nutritivas, caso das Plantas Alimentícias Não Convencionais (Panc’s). Se aquilo cresceu a seu redor, sem dúvida terá os nutrientes de que você precisa”, afirma Gabi.
Pouco conhecidas, as Panc’s são plantas com potencial alimentício e que nascem espontaneamente em diferentes espaços. Como a biodiversidade brasileira é gigantesca, existem cerca de 10.000 espécies de matinho espontâneo, como ora-pro-nóbis, taioba e capuchinha, que crescem em quintais e canteiros pelo país. “Importante ressaltar que nem todas são comestíveis, muitas são tóxicas e é preciso saber reconhecê-las.”
Apostar em diversidade, seja com Panc’s, ervas conhecidas ou menos comuns, é a dica de Gabi para incluir ainda mais saúde, aroma e sabor nos preparos. “O interessante é criar complexidade ao prato. As ervas trazem seis subdivisões de sabor: ácido, doce, salgado, amargo, adstringente e pungente. Então, não tenha medo de misturá-las.”
Ervas em abundância
Na Tailândia, erva é assunto sério. Diferentemente do que acontece na cozinha ocidental, onde as plantinhas são usadas apenas para finalizar os preparos, por lá elas são o elemento principal das receitas. Tanto que a gastronomia tailandesa é mundialmente conhecida pelo frescor, resultado da valorização das ervas nativas.
Foi por causa dessa cozinha, repleta de complexidade, que Mauricio Santi tornou-se cozinheiro, há 17 anos. Depois de ter trabalhado em diversos restaurantes de gastronomia thai pelo mundo, inclusive na própria Tailândia, ele pôde conhecer a fundo os costumes gastronômicos daquela região, no Sudeste Asiático.
Quanto às ervas, Mauricio garante que são muito mais do que simples elementos decorativos. “Para ter uma ideia, a pluralidade de ervas frescas da cozinha tailandesa é infinitamente maior do que no Brasil. Por lá, usam-se cerca de 30 tipos no dia a dia”, afirma.
Coentro, hortelã, folha de limão-kaffir, cebolinha, manjericão e bai cha plu, folhas finas em formato de coração com leve sabor apimentado, são algumas das ervas mais comuns na Tailândia. “Mas, dependendo da época do ano e da região, é possível encontrar diferentes variedades dessas mesmas plantas. Há ainda inúmeras ervas selvagens que, em períodos de chuva, por exemplo, crescem tanto que brotam até pelas paredes.”
Por consequência, não é pouca a quantidade de ervas que integram os preparos tailandeses. A exemplo disso, Mauricio reproduziu para o Mamuang Thai House – novo nome do restaurante Obá, no qual ele trabalhou até setembro de 2018 – duas receitas bastante consumidas no país e que trazem as ervas como protagonistas.
Na cozinha
No kuai tiau ped, um consomê de pato com noodles de arroz, as ervas têm o papel de balancear a potência das especiarias e a gordura do caldo. Quando esses sabores se intensificam no paladar, basta abocanhar as ervas – uma combinação entre moyashi, folha de salsão, cebolinha e coentro – para ganhar frescor, textura e ainda mais variedade.
Já o laab hed, uma salada vegana de cogumelos, recebe as ervas durante o preparo e são servidas também como guarnição. “Elas são um complemento para o prato, que é supercítrico e apimentado”, diz o chef. Ele afirma ainda que o mix de ervas pode variar, dependendo do paladar de cada um. “É um preparo característico do nordeste da Tailândia. Ali, eles estão em casa e escolhem as ervas que estão brotando no quintal. A importância é sempre equalizar os sabores.”
Mauricio garante ainda que existe um extenso leque de sabores que as ervas oferecem. “Ao prová-las, se você fechar os olhos, perceberá diferentes experiências no paladar. Tudo isso junto completa e traz complexidade aos pratos.”
